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terça-feira, 8 de outubro de 2013

Memórias de um cabo de vassoura

                                          Orígenes Lessa

          Destino de quem foi árvore ou galho é dureza...
      Os homens que nos utilizam e nos utilizaram, desde o começo dos tempos, cortando, serrando, aplainando, enfiando pregos, são de uma insensibilidade impressionante. Pensam que madeira não tem alma. Classificam-nos entre as coisas “inanimadas”. Os seres animados são eles. Eles e os bichos. E quando falo bichos, digo desde o leão, que é nobre e valente, o tigre, que é ligeiro e feroz, a águia, que domina os céus, até a cobra traiçoeira, covarde e venenosa, que se arrasta no chão, e mesmo a miseriazinhas insignificantes como a pulga, sugadora de sangue humano em casa onde não há limpeza e DDT, e ao cupim, que destrói a madeira, principalmente a de natureza mais frágil, como é o meu caso, que não sou carvalho nem jacarandá, sou apenas pinho. Para o nosso grande inimigo (o homem, não o cupim), nós não passamos de “coisa”. Que pode ser aproveitada de mil modos, sempre para satisfazer exclusivamente ao seu egoísmo e aos seus interesses imediatos, com uma indiferença total pelo que possamos sentir. Nunca passou pela cabeça desses monstros o que pode passar pela cabeça de uma árvore, ou pelo coração, quando um homem se aproxima de machado em punho.
      Pior, porém, do que machado, serrote e prego, destino trágico e sem conserto, é a madeira que o bicho-homem utiliza apenas como lenha.
     Destino de lenha é fogo!
     Esquecido esse negócio de prego e maus-tratos que sofremos ao longo da  vida, claro que há muita coisa bonita no destino da gente.
     Ser barco, deslizando à flor das águas...
     Ser mastro de navio...
     Ser pau de bandeira, o pessoal batendo continência...
    Ser portal de palácio, ser porta de igreja, ser altar bem trabalhado (a preparação é dura, mas    o resultado compensa), ser móvel de luxo, ser berço de criança, acabar escultura são coisas que nos consolam de qualquer sofrimento: serrote, serra mecânica, entalhe de pancadas cruéis...         
    Eu tive um colega (colega em madeira, não na profissão) que viajou muito. Esteve em Congonhas do Campo. Conheceu um santo, não de pedra-sabão nem de mármore, mas de madeira. Vocês precisavam ver o orgulho com que ele dizia:
    – Eu fui esculpido pelo Aleijadinho... Vem gente me conhecer de todos os cantos da Terra...
    Claro que essa conversa só nós entendemos. Nossos temores e alegrias escapam aos homens, insensíveis, por natureza, às nossas mais íntimas reações. Que são como as dos homens, as mais diversas. Como entre os homens, há madeira para tudo. Há madeira cujo sonho é ser cadeira, por exemplo. (...) Mas há madeira que preferia até ser lenha a ser cano de espingarda, por exemplo.



1-Pesquise quem foi Aleijadinho



2-Procure  os significados das palavras sublinhadas



3-Conte com suas palavras como se sentia o personagem sendo um  cabo de vassoura.




4-Monte, com as palavras do glossário, um jogo de caça-palavras ou  palavras cruzadas.





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